Covid-19

Companheiras e Companheiros,

Se nos tivessem perguntado há um mês o que nos estaria a preocupar em meados de Março de 2020, teríamos dito as revoltas populares na América Latina, o ativismo pelas alterações climáticas, as eleições norte-americanas e, claro, a preparação para o nosso incrível encontro no verão. Ninguém pensou que um vírus, de repente, estaria no topo dessa lista. Excepto, talvez, os Simpsons.

Neste momento, coletivamente, estamos a lidar com o choque e a desorientação. Claramente levará algum tempo até que a poeira assente e tenhamos uma melhor compreensão da shituação. Mas por agora estamos fora de pista. Não há um caminho concreto traçado. Manter a calma e usar o bom senso para nos mantermos seguros parece ser o melhor conselho. No entanto, com notícias de surtos em campos de detenção de refugiados onde as pessoas foram injustamente mantidas em condições abismais antes de terem de lidar com o coronavírus, todos nós precisamos de reconhecer o nosso privilégio e estar gratos.

Alguns perderam as suas vidas, há quem tenha perdido os seus amados, uns simplesmente resistiram a constipações, enquanto outros continuam saudáveis. Há os que esperam uma resolução rápida e outros preveem um colapso total para que possamos ser forçados a uma nova forma de crescimento económico. Enquanto os nerds da ficção científica imaginam as utopias do solarpunk, os religiosos derrotistas advertem sobre o fim dos tempos e os teóricos da conspiração descobrem enredos geopolíticos complexos, a maioria de nós simplesmente permanece preocupada, tentando encontrar um equilíbrio entre o otimismo e o pragmatismo.

Uma possível bênção de um colapso de sistema tem sido a desaceleração das coisas. Um mantra ecoativista diz: “os tempos são urgentes, temos de desacelerar, os tempos são urgentes, temos de desacelerar.” Na verdade, agora somos obrigados a abrandar. Para refletir. Para descansar. Para repensar as prioridades. Quarentena, ou Vipassana involuntária? Talvez precisemos de nos isolar para aprender como nos relacionarmos de forma significativa. (“Não faças apenas alguma coisa, fica aí!” disse o coelho branco à Alice.)

O Waking Life é um pequeno festival familiar e, ao mesmo tempo em que temos dedicado as nossas vidas a este pequeno encontro especial à volta da lago, este novo clusterfuck (: deixa-nos preocupados. Por agora, apenas eventos até maio estão a ser oficialmente cancelados. Embora estejamos confiantes de que a vida do Waking Life será preservada devido às nossas datas de meados de agosto, tudo o que podemos fazer por agora é esperar. A melhor forma de manter a tranquilidade é congelar a última venda de bilhetes até à primeira semana de maio, até vermos a situação a estabilizar um pouco, para sabermos em que ponto estamos. Todas as inscrições feitas permanecem válidas, agradecemos a vossa compreensão.

Como uma família que precisa cuidar de si através da entreajuda, a nossa principal preocupação é a segurança e a saúde de todos os participantes, equipa e comunidades locais envolvidas. Mesmo que só possamos tirar conclusões mais concretas no decorrer das próximas semanas, estamos a acompanhar de perto o desenvolvimento do Covid-19 e a estudar os possíveis resultados no caso de este ainda existir mais próximo dos meses do verão. Informaremos a nossa comunidade assim que houver desenvolvimentos que possam (ou não) influenciar a edição deste verão. Por favor, tentem ser pacientes, nós vamos manter-vos atualizados, uma vez que, ao mesmo tempo, permaneceremos vigilantes e informados sobre as políticas e regulamentos emergentes desta situação.

Continuamos a trabalhar na nossa quarta edição ao tentarmos manter-nos inspirados e não intimidados, para transformar o colapso num progresso. Um avanço na forma de vivermos juntos, como tratamos a nossa casa, o que consumimos e porquê, como amamos, nos importamos e evoluímos.

Também queremos honrar todos os nossos camaradas do mundo da arte. Todos os museus, galerias de arte, clubes, salas de concertos e festivais independentes que fecharam, que foram adiados ou cancelados. Especialmente aqueles sem grandes financiamentos (corporativos) que, como nós, dependem inteiramente da venda de bilhetes e do apoio das suas comunidades. Muitos dos espaços onde nós podemos reunir para imergir em arte, healing, dança e transcendência já lutavam para sobreviver no tempo do pré-vírus. Agora, os lockdowns estão efetivamente a impedir o suporte de vida de artistas, donos de espaços, curadores, agentes, organizadores e todas as pessoas em empregos precários nas artes (a maioria de nós). Sabemos que ‘Earth’ sem ‘art’ é apenas ‘Eh’, mas esquecemo-nos frequentemente disto: é nas palavras dos poetas, nas telas dos pintores, nos acordes dos músicos que se torna possível imaginar um futuro mais doce.

Camus escreveu A Peste em 1947, mas bem poderia tê-lo escrito a semana passada. “Nos primeiros tempos, quando eles pensavam que esta epidemia era muito parecida com outras epidemias, a religião (hoje em dia mais materialismo e neoliberalismo) manteve o seu fundamento. No entanto, uma vez que estas pessoas perceberam o seu perigo imediato, eles deram os seus pensamentos ao prazer. E todos os medos hediondos que marcam os seus rostos durante o dia se transformam numa espécie de exaltação agitada, uma liberdade inquieta que lhes corre pelo sangue.” Temos passado muitas noites sem dormir, a discutir possíveis cenários futuros, assim como o porquê de fazermos o que fazemos. E é desta liberdade inquieta que o Waking Life está ao serviço. A imparável e criativa força vital da música, da dança e da arte que empurra os sonhos para a realidade e impregna as nossas vidas com magia e significado.

Beijinhos (estes terão que permanecer virtuais por um tempo), estaremos ‘em contacto’ (:

A família do Waking Life


*Para informações úteis e adicionais, o Coronavirus Tech Handbook (
https://coronavirustechhandbook.com) é uma plataforma aberta, distribuída e de acesso público que é regularmente atualizada e contém algumas sugestões úteis de sobrevivência.